1.12.10

O AMANTE


Do dramaturgo Harold Pinter, ‘O Amante’ tem um casamento de 10 anos como alicerce para embasar as discussões de relacionamento da peça.

Tema típico do mundo moderno – e por que não de todos os tempos? –, a história aborda os conflitos dos personagens interpretados por Paula Burlamaqui e Daniel Alvim, que surpreendeu no papel do marido. Paula passeia um pouco pelo insosso, numa personagem meio clichê – talvez seja característica da própria personagem –, e deixa Daniel roubar a cena.

A comédia dramática se passa no apartamento do casal. Sarah tem um amante que frequenta sua casa de três a quatro tardes por semana, sob o aval do marido que, enquanto isso, está na empresa trabalhando ou, eventualmente, copulando com a sua amante, ‘que é apenas uma puta, não uma amante’, caso também assentido pela mulher. Richard e Sarah discutem as razões pelas quais as pessoas traem, o porquê de ter amantes, e concluem que a mulher trai com sentimento, enquanto o homem trai apenas pelo sexo, pelo novidade. Mas concordam que os amantes – seja um caso sério, ou uma prostituta – servem para que cada um, a seu modo, reacenda a chama do casamento que se perde com o tempo.



O surpreendente da peça é que o amante de Sarah e a prostituta de Richard não existem, são nada menos do que eles mesmos – criam, dão vida e interpretam seus próprios casos extraconjugais, e fingem que são pessoas diferentes para salvar o casamento da rotina. Muito sutilmente feito – é uma informação que não é escancarada na peça, o que faz disso um fato muito interessante. Os menos atenciosos poderiam pensar que de fato havia um amante e uma prostituta. E muito bem imaginado, já que o amante de Sarah tem uma mulher imaginária que também sabe do caso, tem uma personalidade bem marcada e se mostra bem diferente de Richard. A prostituta de Sarah não aparece muito, e não causou muito impacto. Por isso, a atuação de Daniel como o marido e o amante mereceu um pouco mais de aplausos. Mais caricato, com mais paixão.

Destaque na peça são as cenas cheias de erotismo e diálogos provocantes, numa esfera de desconfiança em que se perde o controle do que é verdade e do que é mentira – o casal embarca na ideia de terem realmente outras pessoas em suas vidas e vivem isso como se fosse real. É a verdade da cena – os amantes se tornam pessoas reais. As cenas eróticas são quase que coreografadas, como a cena da simulação do sexo oral primeiro feito por ele, depois por ela, parados num mesmo ponto, movendo-se da mesma forma, como se fosse uma dança, uma coreografia. Além disso, o brilho da peça fica também para a plateia, que deve identificar, entre os então quatro personagens, o que é verdade e o que é mentira. Um desafio, para o público e para os atores.

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