10.7.07

O crime que abalou a São Paulo dos anos 30

O Castelinho da Rua Apa carrega um segredo há quase 70 anos: quem matou a família Guimarães dos Reis?

por Lisbeth Assis


A alta sociedade de São Paulo foi abalada por um crime até hoje não solucionado. Em 12 de maio de 1937, o Castelinho da Rua Apa, como ficou conhecido o castelo situado no cruzamento da Apa com a avenida São João, no bairro da Santa Cecília - Centro, tornava-se palco de um dos acontecimentos que ocupou por dias as manchetes dos jornais da época: o assassinato da rica e tradicional família Guimarães dos Reis.

Após a morte do patriarca, Vicente César dos Reis, que trouxe da França a idéia da arquitetura do castelo, Álvaro, o irmão mais velho, assumiu os negócios do pai. Advogado, de 45 anos, gostava de praticar esportes, freqüentar festas e flertava com muitas mulheres. O típico boêmio, na volta de uma viagem à Europa, veio com a idéia de transformar o Cine Broadway, conhecido patrimônio da família, em um rinque de patinação. Descontente com a sugestão, Armando, irmão mais novo de Álvaro, também advogado de 43 anos, mais recatado e discreto, tentou por diversas vezes impedi-lo. Para Armando, a mudança poderia trazer prejuízos financeiros à família.

Supostamente, este teria sido o motivo que desencadeou o crime numa noite em que, além dos dois irmãos, o corpo da mãe de ambos, uma senhora de 73 anos dedicada à prática religiosa, também foi encontrado.

Há varias versões para o caso e uma pergunta que nunca foi respondida com clareza: teria sido um duplo homicídio seguido de suicídio ou um triplo homicídio? Segundo a versão da polícia, Álvaro teria sido o autor do crime, pois a pistola estava registrada em seu nome; matou o irmão durante uma briga num momento de descontrole e ira, matou a mãe, que possivelmente quis apartar a discussão e, em seguida, suicidou-se.


Controvérsias

As evidências levam a outras possibilidades. Projéteis de uma arma de calibre diferente no corpo de Maria Cândida Guimarães dos Reis, a mãe, reforçam a hipótese de haver uma quarta pessoa na casa no dia do crime. A arma foi encontrada próxima à mão direita de Álvaro, que era canhoto. E o fato mais curioso é o de que o irmão apontado como autor do crime foi encontrado morto com dois tiros, inviabilizando a afirmação concreta de que houve um suicídio. A polícia, entretanto, nunca investigou estas hipóteses e deu o caso como encerrado, apontando realmente Álvaro como o assassino.

Pelo fato da família não ter deixado herdeiros, o Castelinho tornou-se pertencente ao governo e encontra-se hoje em um estado deplorável, necessitando de uma reforma urgente. Parte dos telhados e das paredes já ruíram e corre o risco de desmoronar.

Atualmente, com autorização federal, o imóvel é ocupado pela entidade assistencial Clube de Mães do Brasil, cuja proposta é transformá-lo em um centro de convivências educacionais para crianças carentes e idosos, com atividades que proponham a inclusão social. Mas para que isso se concretize, visto que o Clube de Mães não possui recursos financeiros para tal, faz-se necessária uma reestruturação na construção para poder ser usado com os objetivos sociais alvitrados pelo projeto.

Em razão do mistério sobre o caso do Castelinho da rua Apa, diversas lendas e contos urbanos foram criados. Mesmo que este tenha sido por muitos anos habitado por moradores de rua, tendo se transformado num cortiço temporário, quem por lá passava dizia ver e ouvir coisas no local: vozes, gritos, conversas e a resposta questionável à questão lançada deram ao castelinho a fama de mal assombrado. O enigma continua e este talvez seja um crime que nunca será desvendado.




“Eu era menina quando aconteceu, mas lembro. Lembro da minha mãe conversando com minha avó, que estava um entra-e-sai no castelinho da esquina, porque tinham matado ‘os ricos’. Me assustei e não queria mais passar ali, com medo de que fizessem algo para mim também, porque não sabiam quem tinha matado a família”
Maria Thereza Trotta, 82, antiga moradora do bairro da Santa Cecília


“Ah, dizem que os móveis se arrastavam, que tem fantasma até hoje, barulhos. Mas eu nunca ouvi nada não, nem mendigo não tem mais lá. Isso é lenda que o povo conta para assustar”
“Mas e se a gente levar o senhor lá dentro, só pra confirmar que não tem nada?”
“Ah... daí não”

Antônio Pedro Rocha, 55, trabalhou como pedreiro numa residência próxima ao Castelinho por 4 meses e passava em frente duas vezes por dia


“De onde eu trabalho, dá pra ver o castelinho da janela. Mas eu nunca olho, tenho medo. Ainda mais de madrugada... só não conta pra ninguém porque eu sou vigia e pode sujar pra mim se meu patrão ler isso”
Mariano, 42, vigia


“De vez em quando vêm umas pessoas e ficam aí, deve ser do Clube das Mães (aponta para o outdoor com a identificação do clube). Mas é muito raro. Tinha uma época que estava tendo teatro, aí tinha mais movimento, era menos assustador. Até simpático. Era uma coisa boa pra se fazer aí, pena que acabou”
Adelina Fidélis, 60, moradora do bairro da Santa Cecília desde 1965



[matéria realizada em 12 de novembro de 2006]

Um comentário:

Unknown disse...

'oi, eu sou um fantasma'

=)